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Café

No quarto gelado e escuro, com os olhos entreabertos, tateio pelas cobertas e encontro o celular: 8h32 da manhã de sábado. Lembro das palavras da noite anterior, que afirmavam com convicção que eu dormiria a manhã inteira e não queria interrupções, por favor. Que piada. Decidi levantar, o sono já não habitava mais o meu corpo, que só pedia por um café quentinho. Pela varanda da sala, vejo uma Teresina diferente do habitual: nublada, brisa leve balançando a cortina, na calma de uma manhã que está começando. Respiro fundo e agradeço… mais um dia em que vivo, não só existo, e que desejo viver.  

Aqueço a água e me preparo para coar o café, o que se tornou quase um ritual. Aprendi a comprá-lo em grãos, apreciar o cheiro da fruta (sim, fruta, não é semente… o que é uma decepção, já me preparava para uma analogia com Gilberto Gil e Drão). Hoje escolhi o café da Kopenhagen, estou me sentindo fancy o suficiente para isso. Escolhido o café, o passo seguinte é moer o grão num moedor específico, durante poucos segundos, observando a granulação correta. A intenção é atingir uma granulação média – nem grossa, nem fina -, para coar adequadamente. Pode existir arte em tudo, basta um olhar atento e cuidadoso, não é mesmo?

Eis que o triturador faz barulho por poucos segundos, para, mais alguns outros segundos… e pronto. Uso a água, que a esta altura já está fervida, para molhar o filtro de papel antes do primeiro contato com o pó de café. Esse processo é necessário para não deixar o gosto do papel impresso junto ao café, retirando resíduos e sabores adicionais da folha (sim, eu sei… são muitos detalhes). Finalmente, é hora de adicionar água em fio ao café, deixando o líquido escuro gotejar no recipiente de vidro. Escolho uma xícara e, contrariando minha inclinação para o sofisticado, deixo a Tania Bulhões de lado e pego uma caneca com o dizer “All you need is coffee”. Foi um presente recebido numa palestra que dei recentemente no hospital – é, foi esse tipo de pessoa que me tornei: a que recebe convites para debater temas de saúde. É uma vitória e comemoro usando a caneca para tomar meu bom café.

Olho para a vitrola que meu pai me deu e para os discos logo abaixo, começo a escolher o que ouvir: fico entre Gal e Tom&Elis, mas Gal Costa seria uma excelente trilha sonora para este momento. Coloco o vinil, levanto o braço da vitrola e espero a agulha fazer sua função de iniciar o som. Ela não o faz. Frustrada, olho para o disco, me questiono se há algum risco, alguma falha nas linhas. Troco o disco, quem sabe hoje seja mesmo dia de ouvir Tom&Elis… nenhum som sai da vitrola. Os discos não são o problema, provavelmente algo danificou a agulha do aparelho. Olho pro Marvin – agora é só você: você que vive passeando pelas prateleiras, definitivamente andou mexendo na minha vitrola, com suas garrinhas afiadas de gato e curiosidade sempre direcionada ao proibido.

Bom, definitivamente não é mais o ambiente idílico que eu tentei criar. Até pensei em ir comprar um jornal na banca de revista, mas hoje nem é domingo e ando avessa às notícias. Tudo bem então ouvir pelo youtube que “fomos felizes e felizes fomos, e se já não somos, meu amor… não se preocupe não, aperte a minha mão, até a luz sumir em meio à escuridão”.

Nem tudo sai como planejado, às vezes por culpa nossa, às vezes por culpa de um arranhão. Não deixa de ser uma manhã bonita, não deixa de ser um bom café e as adaptações são necessárias para a vida seguir… não exatamente como imaginávamos, mas numa realidade quase tão boa quanto aquela que sonhamos. Quase.

Minha vitrola foi para o conserto, e de fato o problema é a agulha, algo contornável. Se fosse um disco danificado, daí sim, estaríamos lidando com um problema sem conserto. No máximo, substituição.

Fazemos da vida o que ela nos permite fazer. Algumas falhas são permanentes e irreparáveis, alguns discos nunca mais voltam a ser tocados, alguns sons nunca mais são ouvidos, alguns momentos nunca mais serão vividos com aquela trilha sonora. De teimosia, sou daquelas que mesmo danificado, olha para o disco com afeto, quase como um souvenir que não sabemos mais onde guardar, pelo apego e pelo desejo de que magicamente tudo se repare. Mas, só consigo ouvir claramente a voz de Gal:

“Quantas vezes eu tentei falar

Que no mundo não há mais lugar

Pra quem toma decisões na vida

Sem pensar”.

Pelo menos o café está bom.

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Seja mulher.

O ar frio, o cobertor quente, a cama convidativa. A hora de dormir tem sido a minha preferida nos últimos anos. Cair no sono, esquecer-se, não existir por um momento, Morfeu e eu enrolados nos braços um do outro, pelas horas que o despertador permitir. Mas, de repente, um barulho. Um bater de objetos na mesa da sala, uma voz que foge da entonação que as 3 da manhã pedem. Meu cobertor tão confortavelmente posicionado, – finalmente aconchegante, pois a insônia independe de quaisquer mil fios-, de repente puxado. E assim a cabeça gira tentando processar acusações que a embriaguez não deixa margem para defesa. Coisas passadas, presentes e futuras discutidas ao mesmo tempo, ao som da voz alterada. A vontade de gritar, de entoar em alto e bom som “pelo amor de Deus, pare!”, numa tentativa desesperada de uma mente conturbada em fazer tudo cessar… mas a certeza de ouvir, quase em câmera lenta, “está maluca?”, porque é assim que os argumentos são facilmente descartados. Sua sanidade mental questionada. Os remédios na gaveta apontados como firme prova. Será mesmo, caro leitor (e aqui, me refiro a você, leitora, carreadora da desgraça de Eva, da maldição de Medusa)… será que não estás mesmo maluca? Será que, no fundo, não mereces cada grito, cada frase de abuso, pois és humana e como tal, pecadora desde a fundação deste mundo caído? Teu terapeuta dirá que não. Melhor acreditar nele. E depois de 3h, 180 minutos, 10800 segundos ouvindo o impensável, especialmente de quem se ama – porque tudo sofre, tudo crê, tudo supera e toda a baboseira; depois de meia madrugada absorvendo tudo aquilo que teus pais te criaram para não ouvir, que tuas amigas te dizem ser inadmissível, que teu terapeuta te diz, com palavras sensíveis, “não permitas, é mentira”… finalmente vem o pedido de ajuda. Para quem for. E, independente de quem seja seu salvador, você estará errada. Deveria ser adulta o suficiente para lidar com seus problemas sozinha. Não somente errada como fadada a alcunha de inimputável, incapaz de lidar com os estorvos da vida adulta, porque ela é assim mesmo. Difícil. Cheia de duras penas. E se outras aguentaram, através dos séculos, o que te faz especial? Engula o choro. Engula todo o restante. Seja mulher.

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Documento. Em branco.

A página em branco é o tormento do escritor. Cada espaço a ser preenchido parece um desafio inalcançável, um túnel branco sem saída, cercado por pensamentos que se enrolam a despeito da tentativa de desembaraçá-los. É como uma caixinha de colares há muito esquecida, cujos cordões prenderam-se uns aos outros: várias possibilidades a serem exploradas, amarradas umas às outras de forma quase impossível de desacorrentar. Nesse emaranhado de ideias desorganizadas, nem sempre de ouro puro, quantos anos não deixei em minha frente uma página em branco a ser escrita, pedaço por pedaço. Quantos anos deixei o roteiro seguir como bem quis, sem me apropriar da minha voz e das minhas palavras. E não me julgues leitor, verás como é fácil perder-se num oceano branco, flutuar sob as asas de uma folha de papel que não é sua, e aos poucos perceber-se parte de uma narrativa que não lhe pertence… Diretor, roteirista, protagonista? Não. Você é o coadjuvante.

Foto por Steve Johnson em Pexels.com
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Onde está Olivia Pope?

Alberto Nisman Entre um episódio e outro da série Scandal e na espera ansiosa pela terceira temporada de House of Cards, abro sites de notícias e me deparo com a seguinte matéria: “Promotor argentino que denunciou Cristina Kirchner é encontrado morto”. Paro, leio, releio. Alberto Nisman, promotor federal, foi encontrado morto no banheiro de seu apartamento, no bairro portenho de Puerto Madero. A seu lado havia uma arma e um cartucho de bala. A porta do apartamento estava trancada por dentro. Surge então a primeira e mais óbvia resolução para o caso: suicídio. Onde está Olivia Pope quando mais se precisa dela? Explico.

18 de julho de 1994. 85 pessoas são mortas e 300 ficam feridas num atentado contra a Amia – Associação Mutual Israelita Argentina -, centro de convivência de judeus em Buenos Aires. Procuradores argentinos, anos mais tarde, acusam formalmente o Irã e o grupo xiita Hizbollah pelo crime.

“Não fomos nós”. Denúncias de compra de depoimentos. Interpol expede ordem de captura contra ex-funcionários iranianos. Acordo entre Irã e Argentina para esclarecer a responsabilidade pelo atentado paralisa a ordem da Interpol. Comunidade judaica da argentina não gosta. Nem o promotor Alberto Nisman, que não tinha conhecimento do acordo. Escutas telefônicas. Denúncia contra Cristina Kirchner. Ministro das Relações Exteriores, Héctor Timerman, o deputado situacionista Andrés Larroque, os líderes sociais kirchneristas Luis D’Elia e Fernando Esteche, o ex-juiz de instrução Héctor Yrimia e o líder comunitário iraniano Jorge Yussuf Khalil também são acusados.

A denúncia, baseada em escutas telefônicas, acusa Cristina Kirchner e os outros nomes citados acima de encobrirem os suspeitos do atentado contra a Amia. O motivo: impunidade em troca de petróleo. Pra quê justiça, quando se tem uma crise energética gigantesca no país? A oposição aguardava ansiosa a presença do promotor no Congresso, nesta segunda-feira, ocasião em que seriam revelados detalhes da denúncia feita na quarta-feira passada. Sua escolta deveria buscá-lo hoje às 11h30 da manhã. Nisman, que já vinha recebendo ameaças, disse em entrevista que “poderia sair morto disso”.  Infelizmente, foi o que aconteceu.

Segundo o jornal Clarín, os primeiros resultados da autópsia do corpo de Alberto Nisman já estão nas mãos da justiça e devem ser divulgados para a imprensa ainda hoje. O secretário de Segurança, Sergio Berni afirmou que “todos os caminhos levam a um suicídio”. Bem conveniente.

Jogos de poder, conspiração, manipulação de fatos e pessoas, chantagens, acordos feitos por debaixo dos panos, provas que desaparecem, ataques ao caráter que geram desmoralização, assassinatos. Esses são ótimos enredos para filmes e séries, mas que se mostram cada vez mais reais em casos como o de Nisman. Não sabemos o que vem por aí, qual será o resultado da balística ou da autópsia. Mas, não consigo ser muito positiva. Parece que sempre existe um poder maior do que o poder da democracia. E existe mesmo. Infelizmente Nisman não esteve hoje no Congresso mostrando as provas em que fundamentou sua denúncia. E nem estará. Inclusive, não sabemos sequer onde estão as mais de 300 gravações de escutas telefônicas, realizadas nos últimos anos e que estavam com o promotor. É mais um triste fato a ser registrado na investigação, que tem se arrastado nos últimos 20 anos.

A morte do promotor pode sim, não ter nada a ver com Cristina Kirchner ou com a denúncia feita poucos dias atrás. Mas as suposições feitas sobre a morte de Alberto Nisman não são fruto de teorias da conspiração. Um promotor morto por um governante de um país? Um enredo que Frank Underwood, Olivia Pope e seus gladiadores, Cyrus Beene, Jack Ballard, Rowan Pope e o B613 não estranhariam. Porque deveríamos nós? A república vizinha sofreu hoje um grande golpe e se as respostas não surgirem, as teorias virão. E, em ano eleitoral, a morte do promotor pode refletir fortemente.

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Um paraíso no Piauí

Um lugar calmo, em que é impossível andar com algo que não seja um chinelo por causa das ruas de areia. Nestas ruas, que são repletas de restaurantes, é fácil perceber diversos idiomas e sotaques pela presença de pessoas de vários locais do país e do mundo. Atraídas pela combinação perfeita da praia com o conforto de pousadas excelentes, encantam-se com as belas paisagens e a calma que o local oferece. Quem conhece Jericoacoara-CE pode achar, inicialmente, que me refiro a esta cidade. Mas não. Falo de Barra Grande, localizada no município de Cajueiro da Praia, no Litoral do Piauí. De Teresina, são cerca de 400km até chegar em Barra Grande.

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Praia de Barra Grande. Foto: Estevão Aguiar

Na charmosa rua do Pontal da Barra está a pousada que escolhemos para passar o fim de semana. O BGK – Barra Grande Kite Camp – oferece aos hóspedes um visual rústico, com muito bom gosto e ótimo atendimento. O nome da pousada não é por acaso. Os praticantes de kitesurf encontram em Barra Grande as melhores condições para o esporte: areia fofa e sem pedras, águas calmas e vento constante, estando no ranking dos melhores locais do país para a prática do esporte, tanto para profissionais, quanto para iniciantes.

Foto: Site BGK

Foto: Site BGK

Para aqueles que praticam ou simpatizam com o esporte, a pousada BGK é ideal para quem quer entrar no clima do kitesurf. O dono da pousada, Ariosto Ibiapina, tem uma história interessante. Médico em Parnaíba e trilheiro nas horas livres, conheceu Barra Grande e encantou-se pelo lugar. Comprou um terreno à beira da praia e construiu uma casa, em que descansava com a família, recebia amigos e fazia trilhas de moto. Então, descobriu o kitesurf e apaixonou-se pelo esporte.

Foto: Site BGK

O local começou a atrair os praticantes do esporte, que hospedavam-se nos pequenos chalés que Seu Ariosto construiu no fundo do terreno. A procura pelo local foi aumentando e mais chalés foram surgindo. Começava assim a Barra Grande Kite Camp, ou simplesmente BGK. 

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Foto: Estevão Aguiar

Apesar dos benefícios para os praticantes do esporte, a pousada é um paraíso para aqueles que só querem relaxar. Os chalés oferecem, em sua maioria, uma estrutura suspensa de madeira e palha. Em baixo, um pequeno lounge oferece cadeiras e espreguiçadeiras, além de redes que oferecem uma vista deslumbrante para o mar.

No bar da pousada, drinks são feitos e entregues aos hóspedes em seus chalés. O café da manhã é servido junto ao lounge principal – comum a todos os hóspedes – e ao lado é possível ver o espaço de massagens, onde os hóspedes podem aproveitar uma massagem relaxante ao som de uma música suave.

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A pousada é cortada por caminhos em madeira que fazem o acesso aos chalés.

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Saímos do hotel rumo à Cajueiro da Praia – a origem do nome da cidade está no grande número de cajueiros nativos – município em que Barra Grande fica localizada. Durante aproximadamente 15 minutos de carro, percorremos uma estrada de calçamento até o município. Chegando lá, procuramos pelo Bar do Matias, local indicado para almoço pela recepcionista do BGK. Encontramos então o Cabana Bar, nome oficial do Bar do Matias. 

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Oferecendo redes debaixo da cabana que fica na árvore, o lugar é tranquilo e tem uma vista do mar encantadora. É possível ainda arriscar alguns passos no slackline que fica bem ao lado das redes. 

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Matias, dono do Cabana Bar, nasceu na França e aos 5 anos mudou-se para a Argentina. Músico e cidadão do mundo, como ele mesmo diz, Matias passou grande parte da sua vida viajando, decidindo, no último ano, aquietar-se na tranquilidade da praia. Com o dinheiro que juntou ao longo dos anos com a música, alugou o bar, reformou a estrutura do local e passa os dias aproveitando a paisagem que o mar oferece. Ele afirma que seus dias de cidadão do mundo acabaram. Por enquanto.  

No centro da foto, Matias, dono e cozinheiro do Cabana Bar. À direita, Túlio Carvalho.

Filé de peixe com molho de ervas e purê de abóbora com cenoura

E olha, não é difícil entender o motivo da permanência de Matias. 

Foto: Estevão Aguiar

Foto: Estevão Aguiar

Foto: Estevão Aguiar

Foto: Estevão Aguiar

Foto: Estevão Aguiar

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Cajueiros na estrada que liga Barra Grande e Cajueiro da Praia. Foto: Estevão Aguiar

De volta a Barra Grande, desfrutamos outro atrativo do lugar: a gastronomia. Na mesma rua da pousada, encontramos diversas opções de restaurantes muito convidativos. Fiquei encantada com o restaurante La Cozinha, do chef belga Hervé Witmeur. Com luzes baixas, música brasileira tocando e velas iluminando as mesas, o restaurante mistura o requintado com o aconchegante.

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Logo ao lado da mesa em que fiquei, estava a horta do restaurante. Em certo momento, presenciei um dos auxiliares da cozinha recolhendo algum ingrediente que serviria para compor um dos pratos. Um detalhe que fez com que eu me sentisse em casa, como se cada prato fosse preparando especialmente para cada cliente.

Lá, experimentei o Filet ao Molho Gorgonzola com Legumes e Batata Sauté. Nada muito arriscado, já que mais cedo, ao perguntar sobre o restaurante para a atendente da farmácia que fica logo ao lado do hotel, recebi o que parecia ser uma má notícia: o atendimento no La Cozinha deixava a desejar, as comidas eram “gourmet demais”, com preços elevados e pratos pequenos. Assim, decidimos – meu namorado e eu – que o melhor a fazer seria apenas experimentar um dos pratos e seguir para outro restaurante, sem deixar de conhecer o local, mas correndo um risco a menos. Quando o pedido chegou, lamentei a decisão. O prato estava delicioso! Experimentei um dos melhores pratos que já tive a oportunidade de comer. Pedimos a conta e, apesar do atendimento que realmente deixa um pouco a desejar, sentimos o esforço e a simpatia dos atendentes, que andam a passos apressados para atender o restaurante cheio. 

Filet ao Molho Gorgonzola com Legumes e Batatas Sauté do La Cozinha

Seguimos então para o restaurante Bandoleiros, que reinaugurou há pouco mais de dois meses, sendo o atual chef um francês que está em Barra Grande há pouco mais de 6 meses.

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Ao lado do restaurante, está “La Lojita”, uma pequena loja com artigos artesanais.

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No Bandoleiros, pedimos um Filé de Robalo feito com ervas e manteiga. Um prato bom, mas que não chega a ser delicioso como o que eu havia experimentado anteriormente. De sobremesa, provei o Crepe com Nutella, que é de dar água na boca!

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Já a caminho do hotel, decidimos entrar na sorveteria Ora Bolas. Confesso que estava satisfeita com os pratos que havia experimentado, mas ao provar o sorvete “Dodelê” – doce de leite – não pude deixar de pedir. O simpático dono do local, Leandro, está há dois anos em Barra Grande. Nascido em São Paulo, Leandro trabalhava há mais de 8 anos em uma empresa na capital paulista, quando um amigo falou sobre o pequeno vilarejo no litoral piauiense. Decidido a mudar-se para Barra Grande após uma visita, Leandro passou um ano fazendo cursos sobre sorvetes, junto com a sua esposa. A decisão por uma sorveteria foi aleatória, já que ele não tinha qualquer conhecimento sobre o ramo. Ao terminar os cursos, saiu do emprego, comprou o maquinário necessário e mudou-se para Barra Grande. Hoje, feliz com a sorveteria e com a vida no vilarejo, Leandro não pretende voltar para São Paulo. 

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Outro restaurante que merece destaque é o Manga Rosa. Iluminação baixa, mesas na areia e decoração rústica compõem o visual do restaurante. Apesar das cadeiras pouco confortáveis, o ambiente é agradável.

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Foto: divulgação na internet.

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Foto: divulgação na internet.

O prato mais famoso do restaurante é o Peixe Manga Rosa, uma pescada amarela preparada com molho de manga e pimenta. Apesar da fama do prato, experimentei e não gostei. Tive a impressão de um molho que fica na superfície do peixe, mas que sua carne permanece sem tempero. Além da combinação manga, peixe e pimenta não ter me agradado.

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Foto: divulgação na internet.

Pedi então o Peixe à Delícia e, depois do desapontamento com o Peixe Manga Rosa, me surpreendi com um prato extraordinário. Voltei para casa desejando encontrar em Teresina um peixe feito com molho branco, bananas e queijo tão delicioso como o do restaurante Manga Rosa.

Encantada e orgulhosa com a estrutura que encontrei nesta parte do litoral piauiense, decidi já perto de voltar escrever sobre Barra Grande. O Piauí, que oferece uma estrutura tão pequena para os turistas que desejam visitar o nosso estado, vê se desenvolver em seu litoral um paraíso em conforto, gastronomia e diversão. E é fácil notar que as pessoas que acreditaram no vilarejo não são piauienses, em sua maioria. São paulistas, cariocas, mineiros, franceses e belgas que viram o potencial do lugar e hoje estão satisfeitos com os investimentos que fizeram. Em nossa mania de valorizar o que é de fora, deixamos de apostar naquilo que é nosso e que pode tornar-se grande aos olhos do mundo, como Barra Grande tornou-se. Espero voltar em breve nesse lugar que muito me encantou e espero o constante desenvolvimento do que era uma vila de pescadores e que tem se tornado um oásis de tranquilidade e conforto.

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As correntes que me prendem

Trecho do filme 12 anos de escravidão – Música: Roll Jordan Roll
 

Eu poderia facilmente ter perdido as contas sobre o tempo que passei aqui, já que não existe nada que diferencie um dia do outro. Mas, lembro-me bem de cada momento – não é fácil esquecer quando somos marcados pelo ferro. O levantar antes do sol nascer, a comida insuficiente e amarga, o trabalho esgotante, o gosto salgado do suor a escorrer pelo rosto, o colchão de pedra que ironicamente afaga a exaustão. Repetindo-se. Dia após dia. Ano após ano.

Faço parte de uma legião de negros de expressões vazias, vagando, tantas vezes banhados em sangue. Sentindo a mais profunda crueldade humana ser derramada sobre nossos corpos escuros, sem piedade. Porque, afinal, não somos humanos. Somos animais domesticados pelo açoite, que aos gritos e abusos não podemos dar resposta. Como cachorros, baixamos a cabeça, sem nunca revidar.

Ainda sou jovem, mas estou certo de que não viverei por muito mais tempo. Nasci escravo e assim morrerei. Sobrevivendo a cada dia, nunca tive alegrias. De pôr do sol a pôr do sol, não me lembro de um momento sequer de conforto. Endureci bem cedo o meu coração – cada um tem a sua forma de lidar com a dor. Vi alguns enlouquecerem, outros ficarem cegos pela raiva e muitos emudecerem em profunda desilusão. Vi tantos outros, em meio a gemidos, preces e sorrisos, buscarem um conforto – na fé, no amor, na esperança.

Nunca esquecerei o canto que sai daqueles lábios grossos e ressecados, tão semelhantes aos meus. Nesses frequentes momentos, enterramos nossos mortos e a eles oferecemos uma canção, com vozes unidas em uma só. Muitas vezes não cantei. Apenas observava, sentia e ouvia. O som das palmas, das vozes envoltas em sentimentos inexprimíveis, os rostos num misto de revolta, dor e desespero – mas que em algum momento, deixavam transparecer um resquício de esperança num leve traço de sorriso. Esqueciam-se por um instante, envolvidos pela melodia, do sono interrompido pelo chicote. Do som que fazia o arquejo e o último lamento dos que morriam todos os dias. Das lágrimas engolidas pelo chão imundo em que dormiam. No canto fúnebre, cantavam sobre a liberdade que nunca poderiam ter. Ou sobre a morte, tantas vezes em dor almejada.
 
Famintos, sedentos, tão cansados e infelizes. Um dia cairemos para nunca mais levantar – pelo açoite, pela peste, pela fome ou pela exaustão. Não vivemos muito, então sabemos que será logo. Cantamos com a certeza de que um dia cantarão para nós. Naquele dia, as correntes que nos prendem nunca mais tocarão os nossos braços. E finalmente descansaremos.
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Intransponível

 
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A vida nos oferece constantemente desafios a serem superados. Em cada fase das nossas vidas, ultrapassamos barreiras e vencemos obstáculos. Não raro, encontramos um oceano de problemas que parece intransponível. E como é fácil desanimar enquanto nadamos contra a correnteza! É tão mais fácil deixar-se levar pelas águas e sentir o corpo escorrer para o desconhecido. É tão mais fácil desistir da vitória e contentar-se com a derrota pelo cansaço que a luta traz. Como é fácil desistir e trancar os sonhos numa gaveta – jogando a chave para bem longe – fugindo do fantasma que persegue as consciências atribuladas. Na ânsia de sair do nosso presente cruel, nos prendemos ao passado e constantemente dizemos: Como é fácil ser criança!

Infelizmente, perdemos ao longo dos anos as lições aprendidas na nossa infância. Você, como eu, foi um bebê dependente e frágil. Acompanhávamos o que acontecia ao nosso redor com olhos curiosos. Descobrimos aos poucos nossos pequenos dedinhos e os observávamos atentamente. Demos nossos primeiros sorrisos, acompanhados da alegria daqueles que nos cercavam – que permaneceram nos cuidando, alimentando e acariciando. Pouco tempo depois, já tentávamos alcançar os objetos que encontrávamos na nossa frente. Balbuciamos os primeiros sons e percebemos a desaprovação na voz dos nossos pais. Começamos aos poucos a sentar sem apoio e rapidamente, nossos pais já não sabiam onde nos encontrar – já podíamos engatinhar. Logo, arriscamos a ficar de pé. Segurando na mão das nossas mães, sentíamos a segurança necessária para arriscar os primeiros passos. Em pouco tempo, caminhávamos sem ajuda. Em pouco tempo, falávamos. Em pouco tempo, crescemos. E não nos demos conta disso.

Desde crianças aprendemos a superar desafios, a enfrentar os medos e arriscar. Não desistimos de aprender a caminhar, mesmo sem ter ideia de como deveríamos começar. Não desistimos de aprender a falar, mesmo sabendo apenas balbuciar sons inteligíveis. Algumas vezes, superamos sozinhos as nossas dificuldades. Outras, precisávamos de uma mão a nos segurar. Agora, enquanto adultos, nos esquecemos de que, antes de caminhar, engatinhamos. Antes de engatinhar, aprendemos a nos sentar. Esquecemos que, no passado, com muita humildade, aceitamos os conselhos dos mais velhos e escutamos o que nos tinham a dizer. Demos um passo de cada vez antes de começar a correr.

O oceano que surge impetuoso na nossa vida não desaparece pela força do nosso desejo. Ele irrompe nossos dias e tenta nos afogar no nosso medo. Lembre-se então dos seus dias de criança e dê um passo de cada vez. Olhe para trás e pense no que a criança que você já foi um dia faria no seu lugar. Procure segurança naqueles que nunca o desampararam. Deixe a criança que você foi orgulhosa da pessoa que você se tornou. E transponha o intransponível.

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Conselhos mudos

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Não vou ocupar muito do seu tempo contando a minha história. Você parece ser impaciente demais pra escutar sobre um passado tão velho que cheira a mofo.
Nasci em 1927 e nesses 86 anos de vida vi o mundo mudar. Fui criança na Era Vargas e recebi as cartilhas de Getúlio. Vi o início, meio e fim da Segunda Guerra Mundial. Tornei-me médico, casei com Amara em 1958, tive dois filhos. Cantei “Chega de Saudade” e “Desafinado”.  Vi o auge da opressão na Ditadura Militar e presenciei sua queda. Comemorei a Nova República. Estoquei mantimentos por causa da inflação. Meus filhos casaram-se e foram viver em Santa Catarina.  O câncer de mama levou minha esposa aos 52 anos. Aposentei-me.

Vivo só. Tenho um bom apartamento, bem ventilado, grande. Grande demais. Da televisão vem o único som que preenche o lugar. Passo o dia sentado na poltrona passeando pelos canais da TV. Antes lia muito, agora a visão cansada não permite mais.
Se me sinto sozinho? Não. A solidão é a liberdade que dou aos meus filhos de viverem suas vidas. Além do mais, acostumei-me a ela. Melhor estar na ausência de pessoas do que rodeado de companhias vazias.

Todos os dias o Raimundo, meu taxista, me pega em casa às 12h. Como você vê diariamente, almoço aqui no shopping. Gosto de sentar e olhar ao redor, analisando as pessoas que passam. Não é por querer que os velhos adquirem esse rosto de sabedoria muda. É pelo muito pensar. Tenho um mundo particular aqui dentro, que adoraria aconselhar cada pai apressado, cada mãe irritada, cada filho mal educado. Gostaria de dizer-lhes que a única garantia que temos quando nascemos, é que vamos morrer um dia. Vivemos como se nunca fosse acontecer conosco, como se a morte fosse uma piada de mal gosto que ninguém quer fazer parte. Um puxão repentino que te leva pra debaixo da terra, e não te dá tempo de despedir-se de ninguém. Não te dá tempo de arrumar as malas, guardar os papéis, doar o dinheiro acumulado que não vai mais te servir de nada. Não te dá tempo de acalmar as pessoas ao seu redor, de prepará-las pra sua eterna ausência e evitar a perplexidade. 
Mas, quem escuta gente velha?

Preferem olhar-me com curiosidade, sorrindo dos meus passos vagarosos, irritando-se quando atrapalho seu percurso corrido, ou ainda sentindo pena do velho solitário no meio do shopping. Não entendem que talvez, daqui a alguns anos, estarão eles também no meu lugar. Terão dificuldade pra andar, enxergar, ouvir e compreender. Precisarão de ajuda ao atravessar a rua. Isso se não partirem antes, no meio de um tiroteio, por causa de uma doença repentina ou de um motorista embriagado. Isso se não deixarem seus filhos perguntando o porquê tão cedo. E terão todas as pistas da sua existência apagadas pelo tempo.

Meus filhos chorarão a minha morte. Meus netos, lembrarão de mim por algum tempo e quem sabe, citarão meu nome em um jantar de família com os bisnetos que não conheci. Com alguma sorte, terei uma fotografia amarelada no velho álbum de retratos esquecido dentro do armário. Logo, o álbum também não existirá mais. Em pouco tempo, todo o legado da minha existência desaparecerá. As gerações seguintes carregarão o meu sobrenome, sem jamais saber quem fui. E assim acontecerá com você também.
Você pode trazer a conta?

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censura, Crítica, opinião, sociedade

Quando a arrogância censura o conhecimento

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Dr. Rodrigo Silva(à esq.), um dos palestrantes do evento 
e o físico Leandro Tessler, que mobilizou professores contra o Fórum.  

“Posso não concordar com uma palavra do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo” 
(Voltaire)
A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) cancelou o “1° Fórum de Filosofia e Ciência das Origens” que aconteceria na quinta-feira, 17. A universidade cedeu às pressões de professores ateus da própria instituição, que alegaram não ser a Unicamp o lugar adequado para discutir sobre o Criacionismo. “Que façam isso numa igreja”, disse o professor de física Leandro Tessler. “É embaraçoso dar credibilidade a esse tipo de doutrina não científica.” 
O fórum contaria com a presença de estudiosos do tema, como o geólogo Nahor Neves de Souza Jr., o físico americano Dr. Russell Humphreys, o jornalista Michelson Borges, o químico Dr. Marcos Eberlin e o arqueólogo Dr. Rodrigo Silva – todos ligados ao criacionismo científico. 
Três dias antes do evento, o Fórum foi cancelado. A Unicamp, em nota oficial, explicou o cancelamento dizendo que “faltavam integrantes que pudessem debater o tema sob todos os pontos de vista”. O professor de matemática Samuel Oliveira criticou o evento. “Criacionistas não têm formação para falar de ciência”, diz.

Em contrapartida, os palestrantes se manifestaram. O químico Marcos Eberlin – professor da Unicamp – escreveu em um blog: “Infelicidade é notar que a melhor universidade brasileira se deixa guiar pela opinião subjetiva de alguns e, mais uma vez, de última hora, impede a exposição de argumentos.” O professor de arqueologia Rodrigo Silva afirmou: “Fomos boicotados por um grupo de professores ateus. Hoje, quem discorda de Darwin é queimado na fogueira.”

Veja aqui a notícia na revista Istoé, as críticas do professor Leandro Tessler e a resposta do Dr. Rodrigo Silva.

Quando li a matéria da revista Istoé, não pude deixar de notar a semelhança do fato com o que ocorria na Igreja Medieval – que não permitia opiniões e posições contrárias aos seus dogmas – acontecendo em pleno século XXI. Assim como a Inquisição, os professores da renomada universidade usaram desculpas e fracas justificativas para evitar a exposição de argumentos contrários às suas ideias. Em sua arrogância, fecharam as portas para o que serviria de conhecimento e formação de opinião de seus alunos – afinal, é assim que eu, enquanto aluna, formo minha opinião sobre determinado assunto: depois de escutar, estudar e analisar criticamente o exposto.
Professores abrem as portas. Nós, devemos escolher por qual delas entrar. Mas, se os mestres nos escondem aquilo que desprezam e nos oferecem apenas aquilo em que acreditam, que liberdade de pensamento há nisso? Que argumentos terei eu para defender uma teoria vazia, que repito por ter ouvido falar?

Não estou aqui para defender o mérito da discussão entre evolucionistas e criacionistas. Acredito sim, em Deus e na criação do mundo de acordo com a Bíblia. Porém, o que exponho aqui é a falta de diálogo e arbitrariedade sobre a informação. O que exponho aqui é o episódio lamentável ocorrido na universidade, que mostrou os defensores do evolucionismo – que um dia tiveram que lutar pelo direito de exibir suas ideias ao mundo – reprimindo o direito de expressão, agindo exatamente como seus opressores do passado. Acredito que o papel de uma instituição de ensino e seus educadores é incitar o debate, abordar temas diversos, incentivar o conhecimento humano, sem restrições. Infelizmente, esse não foi o primeiro caso de censura ao conhecimento e não será o último. 
Imagine só, que mundo diferente teríamos se fôssemos tolerantes e abertos ao diálogo sobre os assuntos que discordamos ou até mesmo, não conhecemos? Imagine que loucura aprender a debater e a escutar opiniões diferentes das nossas?  

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Desatino.

O sol começava a sumir no horizonte. Confundindo-se entre os prédios gigantescos, sua luz diminuía, como se estivesse prestes a se apagar. O tom avermelhado misturava-se ao céu azul-escuro que começava a mergulhar na escuridão. Imperceptível e silencioso, o sol desapareceu na noite que tornava-se cada vez mais densa, palpável. As luzes da cidade tomavam agora o lugar antes ocupado pela estrela brilhante.

Ele, observando o céu e a cidade pouco conhecida ao seu redor, caminhava em direção à sua rotina de cada início de noite. A música no fone de ouvido dava tom a cada rua que atravessava, proporcionando a sensação ambígua de liberdade e arrependimento. A vontade de correr e fugir de todas as lembranças e pensamentos que o prendiam como âncora no mar tomava conta da sua cabeça. No mesmo instante, lembrava do sorriso e do efeito encantador daquela que amava. O coração, então, pesava. Olhou para o horizonte e se perguntou onde ela estaria naquele momento. Enquanto ele tornava-se cada dia um pouco mais desleal – pensando nas suas atitudes tanto quanto alguém que atravessa uma rua desatentamenteela ainda esperava o telefone tocar ansiosamente, na esperança de ouvir sua voz. Pensou, tristemente, na pessoa que ele era – muito diferente da que dizia ser.

Empurrou a porta da lanchonete e fixou seu olhar na mulher que o prendia pelo incompreensível e proibido – viver em meio ao que se desconhece para ele no princípio pareceu detestável. Entretanto, não demorou muito para isto tornar-se o melhor atrativo do enigma que ela representava. Não sabia como explicar, mas ela o fazia tornar-se levemente negligente com o que antes considerava convicções e princípios. Conversavam amenidades, na mesma mesa que os recebia diariamente. Aquela mesa guardava consigo todas as lembranças e planos para o futuro que faziam entre as mãos entrelaçadas. Planos estes que eram quebrados com tanta frequência quanto os palitos retirados distraidamente do paliteiro – partidos ao meio sem o menor esforço – durante uma conversa distraída. Mesmo assim, ele prendia-se àquela vida errônea de aventuras e mistérios, vida esta tão obscura quanto o coração dela.

O anel no dedo o denunciava, mas ela não parecia importar-se. Ele, entretanto, sentia o peso que ele representava e as memórias incrustadas em cada átomo do material que o constituía. Sorriam, porém, dos caminhos distintos que a vida tinha destinado para cada um e da forma que de repente, haviam se cruzado, apesar das diversas placas de Pare no meio da estrada. Todos os dias, o mesmo café os esperava. Lutavam para deixar a vida real de fora das portas de vidro do estabelecimento e conseguiam fazê-lo no momento em que se abraçavam. Lá fora, outras duas vidas ignoravam o que acontecia. Enganadas pelas mesmas mãos que entrelaçavam em outras, pelos mesmos olhares que cruzavam com outros, pelos mesmos lábios que beijavam outra boca.

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